Manoel José do Bomfim (1868-1932)

O sergipano, mais conhecido como Manoel Bomfim, além de autor de livros de leitura e manuais pedagógicos, em suas escritas e ações foi um importante e relevante intérprete do Brasil que ocupou diferentes espaços no império e nos primeiros anos da República. Foi médico, militar, psicólogo, professor, historiador, diretor do Pedagogium e da Escola Normal, diretor da Instrução Pública do Distrito Federal (RJ), deputado estadual, jornalista, apreciador de cinema, entre outras atividades.  

           Sua trajetória na educação, ocorreu em paralelo aos movimentos de construção da identidade nacional, o que ele justificava como a condição de atraso do país, atribuindo-a ao resquício da colonização e dos séculos de escravidão. Ideia que vai ao encontro das justificativas deterministas de raça e de espaço geográfico que circularam no início do século XX para explicar a origem dos tantos “males brasileiros”. 

           Filho de José Paulino do Bomfim e de Maria Joaquina do Bomfim, nasceu no dia 8 de agosto de 1868, na cidade de Aracaju, capital do Sergipe. Seu pai, que foi vaqueiro na infância, tornou-se um reconhecido comerciante e dono de engenho de açúcar ao longo da vida. Primogênito de uma prole de treze filhos, Bomfim foi o único que seguiu uma carreira profissional bem diferente do ofício do seu pai. 

           Graduou-se na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro em 1890. Em 1891, foi nomeado médico da Polícia Militar do Rio de Janeiro. No ano seguinte, passou a tenente-cirurgião da Brigada Policial, posto que ocupou até maio de 1894. Bomfim foi casado com Natividade Aurora de Oliveira, viveu na cidade de Mococa, interior de São Paulo, onde exerceu a função de médico. Teve dois filhos com Natividade: Aníbal e Maria, tendo essa última falecido em 1894 com quase dois anos de idade. A morte de Maria contribuiu para sua descrença na medicina, o fato de não conseguir salvar a filha caçula, e expressou a sua dor trocando a profissão na saúde pela educação nacionalista e suas implicações. Em 1898, ingressou no magistério, lecionando Educação Moral e Cívica na Escola Normal do Rio de Janeiro, na qual assumiu logo depois a cátedra de Pedagogia e Psicologia.  

           Em 1902, foi a Paris com a finalidade de desenvolver os seus estudos em Psicologia, tendo frequentado o Laboratório de Psicologia anexo à Clínica Jouffroy, em Saint’Anne, e estudado com Georges Dumas e Alfred Binet, com quem planejou a instalação do primeiro Laboratório de Psicologia brasileiro, instalado em 1906 no Pedagogium, do qual foi diretor por quinze anos.  

           De volta ao Brasil, em 1905, foi diretor interino da Instrução Pública do Rio de Janeiro e em 1906 foi nomeado Diretor Geral da Instrução Pública do Distrito Federal. Em 1907, foi eleito deputado federal, responsável por defender importantes projetos que envolviam o desenvolvimento da educação no Brasil. 

           Sua extensa obra abrange várias áreas de conhecimento: escreveu sobre História do Brasil e da América Latina, Sociologia, Medicina, Zoologia e Botânica, além de vários livros didáticos, dentre os quais estão alguns de Língua Portuguesa, em co-autoria com Olavo Bilac. Escreveu ainda, na área de Psicologia e Educação, Lições de Pedagogia (1915) e Noções de psychologia (1916), material usado como base para as suas aulas na Escola Normal. 

           Em 22 de novembro de 1918, foi condecorado pelo rei da Bélgica com o oficialato da Ordem Leopoldo. Além disso, exerceu, durante muitos anos, atividade jornalística. Na obra Pensar e Dizer: estudo do símbolo no pensamento e na linguagem (1923), Bomfim traz à tona o seu domínio das mais importantes correntes de Psicologia de sua época. 

           Escreveu também O methodo dos testes (1926); Cultura do povo brasileiro (1932); Crítica à Escola Activa, O fato psychico, As alucinações auditivas do perseguido e O respeito à criança. Sua obra revela um pensamento original, não articulado às ideias dominantes em sua época e sua interpretação do Brasil se sustenta em uma análise histórica da colonização e na exploração das riquezas do país, analisando as consequências sobre as condições culturais do povo.  

           Foi um homem com uma visão ampla da sociedade e que estava à frente do seu tempo em muitas questões. Bomfim, como outros intelectuais de sua época, acreditou que o tema da educação e da instrução pública possibilitava a definição de sua identidade como intelectual, assim como a afirmação da própria identidade nacional da República. 

           Por apresentar uma voz e uma olhar que destoava das visões do grupo hegemônico do momento e por tecer críticas ao conservadorismo oligárquico característico do país no início das primeiras décadas do referido século, a obra de Manoel Bomfim foi relegada ao esquecimento pela historiografia, sendo reavivada no período de redemocratização do Brasil, por volta da década de oitenta. 

           Faleceu aos sessenta e oito anos de idade, na então capital do país, Rio de Janeiro, em abril de 1932, deixando uma série de estudos que problematizam a história da educação do período. 

Obras Publicadas 

BOMFIM, Manoel. A América Latina: males de origem. Rio de Janeiro/Paris: Garnier, 1905. (Reeditado no Rio de Janeiro, pela Topbooks, em 1993.) 

 ______. O Brasil na América: caracterização da formação brasileira. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1929.  

______. O Brasil na história: deturpação das tradições, degradação política. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1930.  

______. O Brasil nação: realidade da soberania brasileira. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1931. 2 vols.  

______. O Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1935. (Coletânea com trechos das obras de Manoel Bomfim)  

______. Os Brasis. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 29 abr. 1928.  

______. The Brazilian. Brazilian Business, Rio de Janeiro, jun. 1922.  

______. A cartilha. Rio de Janeiro: Casa Electros, 1922. 

 ______. Cemitério para cães. A Ilustração Brasileira, Rio de Janeiro, n. 16, 15 jan. 1910. ______. O ciúme: definição. Os Annaes, Rio de Janeiro, ano II, n. 49, 21/9/ 1905, pp. 386-590. 

 ______. O ciúme: aspectos gerais do ciúme. Os Annaes, Rio de Janeiro, ano II, n. 50, 28/9/1905. 

 ______. Crianças e homens. Rio de Janeiro: Casa Electros, 1922.  

______. Compêndio de zoologia geral. Rio de Janeiro/Paris: Garnier, 1902.  

______. Clínica psychiatrica: das alucinações auditivas dos perseguidos – monografia contendo algumas observações de sua clínica psiquiátrica. São Paulo: Typ. Espindola, 1904. 

______. Colação de grau. Discurso proferido em 27/9/1906. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 30 set. 1906.  

______. Crise ?… Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, ano 89, 27 jun. 1915. pp. 6-7. ______. Crítica da escola ativa. A Academia, Rio de Janeiro, ano 4, n. 6, 1929.  

______. Cultura e educação do povo brasileiro: pela difusão da instrução primária. Rio de Janeiro: Pongetti, 1932.  

______. Cultura progressiva da ignorância. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 28/6/ 1919. ______. Darwin e os conquistadores. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 13 nov. 1914. ______. Das nephrites. Rio de Janeiro: Tipografia da Gazeta de Notícias/Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, 1890. (Tese de doutorado)  

______. O dever de educar. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 27/9/1921. 

______. Dos sistemas de ensino. A República, Rio de Janeiro, 7/1/1897. (Reeditado em Cultura e educação do povo brasileiro, 1932).  

______. Elementos de zoologia e botânica gerais. (Adaptação das obras Anatomia e psicologia animais e Anatomia e psicologia vegetais, de Lamounetti) Rio de Janeiro/ Paris: Garnier, 1904.  

______. O fato psíquico, objeto da psicologia: introdução a um curso de psicologia. Rio de Janeiro: Laemmert & C., 1904. 

 ______. História das terras brasileiras. Os Annaes, Rio de Janeiro, ano II, n. 31, 18/5/1905. pp. 292-295.  

______. Instrução popular, A República. Rio de Janeiro, 2/9/1897. Reproduzido no livro Cultura e educação do povo brasileiro (1932).  

______. Lições de pedagogia: teoria e prática da educação. Rio de Janeiro: Livro Escolar, 1915.  

______. Lições e leituras: livro do mestre. Rio de Janeiro: Casa Electros, 1922. 

 ______. Nacionalização da escola. Educação e Ensino. Instrução Municipal do Distrito Federal, Rio de Janeiro, ano I, n. 1, 1897p. 23.  

______. Noções de psychologia: obra didática. Rio de Janeiro: Sociedade de Publicações e Livros Escolares, 1916.  

______. Pensar e dizer: estudo do símbolo no pensamento e na linguagem. Rio de Janeiro: Casa Electros, 1923. (Reeditado em 2006 pela Casa do Psicólogo)  

______. A plástica da poesia brasileira. Rio de Janeiro: Casa Electros, [no prelo em 1923, obra inacabada] 

______. O progresso pela instrução. (Discurso proferido na solenidade da entrega de diplomas às normalistas que terminaram seu curso no ano escolar de 1903. por Medeiros e Albuquerque, d. América Xavier de Lima, dr. Manoel Bomfim, dr. Servulo Lima) Rio de Janeiro: Typ. do Instituto Profissional, 1904.  

______. Olavo Bilac: estudo sobre a vida intelectual desse poeta. Kosmos, Rio de Janeiro, abr. 1904. 

______. A obra do germanismo. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 17 ago. 1914.  

______. Obra do germanismo. Rio de Janeiro: Typ. Bernard Fréres, 1915. (reúne os artigos A obra do germanismo e Darwin e os conquistadores, publicados no Jornal do Commercio)  

______. Pobre instrução pública. [Jornal não identificado], 1915.  

______. O Pedagogium. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 10/2/1919.  

______. Primeiras saudades: leitura para o primeiro ano do curso médio das escolas primárias. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1920. 

______. O respeito à criança. (Discurso pronunciado na solenidade de entrega de diplomas às normalistas de 1905) Rio de Janeiro: Typ. do Instituto Profissional, 1906. (Reeditado em 1933 pela Tipografia São Benedito)  

______. A sociedade do futuro. A Universal, Rio de Janeiro, ano I, n. 26, 30/12/ 1901. pp. 188-189.  

______. Uma carta. Os Annaes, Rio de Janeiro, ano III, n. 74, 1906. pp. 169-170. 

______. Valor positivo da educação II. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 4 jul. 1919.  

______; BILAC, Olavo. Através do Brasil: prática da língua portuguesa. Livro de leitura para o curso médio das escolas primárias. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1910.  

______; ______. Livro de leitura para o curso complementar das escolas primárias. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1901. 

 ______; ______. Livro de composição para o curso complementar das escolas primárias. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1899.  

______; FONTES, Ofélia; FONTES, Narbal. O Método dos testes, com aplicações à linguagem no ensino primário. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1926.  

______; MARQUES, Narciso. Parecer sobre as águas do Rio Poxim. O Republicano, 11 abr.1890 

Referências Bibliográficas 

BILAC, Olavo e Manoel José do Bomfim. Através do Brasil. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1923. 

BOMFIM, Manoel José do. Primeiras Saudades. Leitura para o 1o Anno do Curso Medio das Escolas Primarias. 1 ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1920 

 
Dicionário de autoras(es) de cartilhas e livros de leitura no Brasil [Século XIX]. [E-book] / organizadoras, Diane Valdez … [et al.]. – Dados eletrônicos (1 arquivo : PDF) – Goiânia: Cegraf UFG, 2023. 

SANTOS, Alexsandro do Nascimento. Pátria, Nação, Povo brasileiro na produção didática de Manoel Bomfim e Olavo Bilac: Livro de Leitura (1899) e Através do Brasil (1910). 2010. 130 p. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2010. 


Luiz Fernando da Costa Soares

Bolsista de Iniciação Científica (Cnpq/UERJ)

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